Estado
MPF participa de assembleia de indígenas Apinajé que manifestam ausência do Estado

O procurador da República Álvaro Manzano participou da segunda assembleia ordinária da Associação da União das Aldeias Apinajé - Pempxà, na Aldeia Patizal, município de Tocantinópolis. Além da eleição do próximo presidente da associação, os apinajé debateram temas de interesse da comunidade como a reestruturação da Funai e relativos à pressão que as 24 aldeias da terra indígena vêm sofrendo recentemente, principalmente as mais próximas aos limites. Empreendimentos como monocultura de eucalipto, rodovias, plantações de soja e hidrelétricas estão afetando diretamente a vida nas aldeias, o que motivou convite para que o MPF participasse do evento, que contou com presença do coordenador regional da Funai, Cleso Fernandes, técnicos do órgão, estudantes da Universidade Federal do Tocantins e representantes do Centro de Trabalho Indigenista – CTI.

O sentimento geral manifestado pelos apinajé é de ausência do Estado. Responsável pela denúncia de invasores da terra indígena que retiram madeira, caça e pesca, Oscar Apinajé relatou que sofre ameaças de morte, e que não tem segurança para andar no próprio território. Mas as principais demandas referem-se aos empreendimentos hidrelétricos. Após intensa luta pelo reconhecimento dos impactos indiretos causados pela UHE de Estreito, os indígenas ainda aguardam a liberação da compensação devida pelo consórcio Ceste. Segundo informações do CTI, o processo está há 70 dias com a assessoria jurídica do Ceste, aguardando despacho.

Os índigenas pediram ao MPF que recomende à Funai a não emissão do termo de referência, documento que aponta a condição do local habitado pelos índios e orienta o conteúdo dos estudos relativos ao empreendimento hidrelétrico Serra Quebrada, no rio Tocantins, em sequência a Estreito. Estimativas apontam o impacto direto em 15% da terra indígena, com necessidade de remoção de aldeias e submersão de grande parte de babaçuais nativos, de onde os apinajé obtém renda com a venda dos cocos para indústria. “Esta é a parte mais fértil da terra indígena. Serão grandes prejuízos para nosso povo”, ressaltou Oscar. Em relação ao projeto da UHE de Santa Isabel, no rio Araguaia, o termo de referência já foi emitido pela Funai, mas os índios afirmam que vão tentar impedir a realização dos estudos na terra indígena. “Não queremos que aconteça com o Araguaia o que aconteceu com o Tocantins, para atender a ganância do não índio”, desabafou Oscar Apinajé.

Manzano se comprometeu a expedir recomendação à Funai e ao Ibama no sentido de que não seja realizado qualquer procedimento no licenciamento ambiental enquanto não for regulamentado pelo Congresso Nacional o parágrafo sexto do artigo 231 da Constituição Federal. Também foram debatidos demandas pontuais, como o abastecimento de água na aldeia abacaxi e de energia elétrica na aldeia Bonito. Manzano ressaltou a importância da organização da etnia para buscar, junto ao governo brasileiro, as compensações a que eles têm direito. “A Funai e o MPF não podem fazer muita coisa se os próprios índios não tomarem a iniciativa de cobrar”, disse.

Debate conjunto

Os apinajé desejam que o debate a respeito dos impactos causados pelos diversos empreendimentos sejam feitos em conjunto. Estradas, fazendas e rodovias deveriam ser, segundo as lideranças, ter suas consequências para os índios avaliadas em conjunto. Apesar da dificuldade apresentada em relação à responsabilidade no caso do debate único, a proposta ainda é defendida pelos índios.

Comissão de fiscalização

Problemas com a invasão da terra indígena por não índios para diversas finalidades são antigos. A novidade recente é a frequência com que estes fatos estão acontecendo, o que inviabiliza métodos tradicionais de fiscalização e repressão. “Os invasores estão de volta dois dias após o término de uma fiscalização na área”, relatou o indigenista Fernando Schiavini. Segundo os índios, um não índio recentemente preso após denúncias de invasão, retirada predatória de madeira e incentivo à caça e pesca na terra indígena já está livre e novamente cometendo os mesmos crimes. Sobre a necessidade de os próprios índios defenderem seu território, eles são enfáticos. “Eles entram armados e preparados para nos enfrentar. Muitas vezes temos que aceitar humilhações em nossa própria terra para não morrer”, relata Cassiano Apinajé.

Para enfrentar esta nova realidade, a solução apontada pelos técnicos da Funai é o trabalho de inteligência, já que é inviável manter um grupamento policial em tempo permanente nos limites da terra indígena. Manzano ressaltou que necessita de informações mais precisas a respeito destes crimes, principalmente os nomes dos envolvidos, para que sejam propostas ações penais junto à Justiça. Para obter estes dados, foi proposta uma comissão integrada por membros da Funai, Ministério Público e associação dos índios, que seria responsável pelo monitoramento de não índios que vivem no entorno e realizam atividades criminosas na terra indígena, além de verificar casos de ameaças e propor soluções para divergências internas. O tema volta a ser debatido em reunião a ser realizada na aldeia Cachoeirinha, uma das que mais sofrem com este problema. Existem suspeitas que muitos destes invasores, que cerceiam o direito dos índios de ir e vir em seu território, sejam pessoas com pendências com a Justiça.

Luta política

Diante de grande cobrança dos indígenas, o procurador explicou que ações jurídicas dependem de ilegalidades cometidas para que sejam propostas à Justiça. A regulamentação do parágrafo sexto da Constituição Federal, que estabelece condicionantes para realização de grandes empreendimentos, será cobrada de todas as formas possíveis, comprometeu-se Manzano. “Juridicamente, os índios não podem simplesmente dizer que não querem o empreendimento diante de alegações de interesse nacional. Mas pode-se optar pela luta política, que significa buscar a mudança na concepção do governo, o que requer uma grande mobilização. Nos dois casos, são grandes as dificuldades, mas o MPF se compromete a fazer o que for possível”, finalizou o procurador.

Constituição Federal Capítulo VIII

Dos Índios

Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

§ 6º - São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé. (Assessoria de Imprensa MPF)

Veja Também

O presidente do Sebrae, Décio Lima, afirma que iniciativa é uma ação do Brasil soberano, que abre novos caminhos...
Um relatório intitulado “PIB da Música”, divulgado com exclusividade pela Associação Nacional da Indústria da Música (ANAFIMA), revela que o setor musical brasileiro movimentou...
Objetivo é ampliar debate com parlamentares, especialistas e consumidores diante de riscos de monopólio e aumento de preços no setor pet...
Segundo a entidade, um estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre o percentual estimado de pessoas com deficiência visual...
O levantamento aéreo vai analisar a viabilidade de ocupações e subsidiar estudos para futuros processos de regularização fundiária...
O índice acumula queda de 1,35% no ano e alta de 3,03% nos últimos 12 meses. Em agosto de 2024, o IGP-M subira 0,29% no mês...
A demanda por essa ação específica em Formoso do Araguaia partiu de uma solicitação do prefeito daquele município, Israel Borges...
Ao todo, 1.884.035 contribuintes receberão R$ 2,92 bilhões. A maior parte do valor, informou o Fisco, será para contribuintes sem...
O julgamento terá ampla cobertura jornalística. A Corte recebeu 501 pedidos de credenciamento...
A estrutura do evento já está quase finalizada, segundo a gestão de Palmas: o palco, estandes, tendas e...
O vice-governador esteve presente em três importantes eventos no Tocantins: a festa alusiva ao Dia do Soldado, em Porto Nacional; a final da...
Bancos e instituições financeiras estão impedidos de aceitar novos contratos firmados apenas com a assinatura do representante legal...
Segundo o diretor-presidente da Infra S.A., o Brasil vive um momento de retomada na infraestrutura, com grandes oportunidades...
A taxa de desocupação corresponde ao percentual de pessoas que estão sem trabalho, mas em busca de uma oportunidade. Segundo...
A Vila Sertões estará no Centro de Convenções Arnaud Rodrigues, em Palmas (TO). A abertura da área de box para as equipes será no...
O projeto é coordenado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) e envolve quatro fases de atuação, incluindo esta etapa de serviços itinerantes...
A criação da cobrança seria para custear a malha viária municipal, sobrecarregada pelo aumento do tráfego após colapso da ponte entre...
Desde junho, Ministério Público acompanha e fiscaliza a situação da Ala Ortopédica do Hospital Geral de Palmas...

Mais Lidas

Agenda Cultural

Articulistas

Atividade Parlamentar

campo

Esporte

Meio Jurídico

Patrocinado

Polícia

Sociedade em Foco

Universo Espiritual

Publicidade Institucional