Opinião
STF, IOF e o protagonismo que não lhe cabe: Quando os Três Poderes esquecem seus limites
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A recente decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender os efeitos dos decretos legislativos que haviam anulado o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e de convocar uma audiência de conciliação entre Executivo e Legislativo revela um preocupante desvio de função da Corte Constitucional. Em vez de simplesmente julgar a controvérsia à luz do texto constitucional, o Supremo mais uma vez se coloca como protagonista de um embate político, adotando postura que transcende suas competências constitucionais. 

A questão levada ao STF é essencialmente jurídica: se o aumento do IOF teve por finalidade corrigir distorções no mercado financeiro — o que é autorizado pela Constituição — ou se se tratou apenas de uma manobra arrecadatória para compensar déficits fiscais, hipótese vedada pela jurisprudência e pelos princípios tributários. É nesse ponto que o Judiciário deveria se concentrar. Em vez disso, optou por instaurar uma audiência de conciliação entre Poderes que, formalmente, não estão em litígio judicial. Não há ação do Executivo contra o Legislativo, nem vice-versa. Não há partes, lide ou conflito jurídico processual. Há, sim, divergência política que deveria ser solucionada no espaço próprio do debate parlamentar e da decisão democrática. 

O protagonismo indevido do STF rompe com a separação de Poderes e cria um grave precedente institucional. Ao assumir funções que não lhe cabem, a Corte contribui para a confusão de competências e para o enfraquecimento da democracia representativa. Ainda mais preocupante: se não houver consenso entre os Poderes — o que é o cenário mais provável —, caberá ao STF decidir a questão no mérito, pressionado pelas expectativas políticas que ele próprio criou. O Judiciário, que deveria pacificar, pode acabar aprofundando a crise política. 

De outro lado, o próprio Executivo erra gravemente ao judicializar um tema que, por sua natureza, deveria ser enfrentado com responsabilidade política e econômica. Em vez de tentar impor aumentos de tributos por meio de decretos e buscar o aval judicial para sustentar uma arrecadação forçada, o governo federal deveria apresentar um plano crível de ajuste fiscal. Isso significa cortar despesas, rever privilégios e repensar o tamanho do Estado, em vez de, mais uma vez, transferir o ônus da ineficiência administrativa para o contribuinte brasileiro. 

O Legislativo, por sua vez, também precisa fazer sua parte. Ao mesmo tempo em que resiste a novos aumentos de impostos — postura acertada sob a ótica da carga tributária insustentável do País —, o Parlamento tem o dever de votar com celeridade projetos de interesse público e de dar o exemplo no controle de gastos. Não se pode exigir austeridade do Executivo sem combater os próprios desperdícios, como se vê nas distorções geradas pelas emendas parlamentares de execução obrigatória, muitas vezes capturadas por interesses paroquiais e desconectadas de um planejamento nacional. 

Por fim, o Judiciário não pode se isentar de responsabilidade nesse cenário. O exemplo precisa vir também da magistratura. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) precisa avançar com firmeza em reformas que enfrentem os salários acima do teto constitucional, os benefícios injustificáveis, os auxílios e penduricalhos que transformam a remuneração de juízes e servidores em algo muito distante da realidade da maioria da população. A legitimidade do Poder Judiciário depende, em grande medida, da sua capacidade de se mostrar sóbrio, contido e comprometido com o interesse público. 

A crise gerada em torno do IOF revela um pano de fundo mais profundo: o desarranjo das funções institucionais dos Três Poderes. O Executivo, em vez de governar com responsabilidade fiscal, terceiriza sua agenda ao Judiciário. O Legislativo, enquanto freia os impulsos arrecadatórios, tolera o próprio inchaço e o uso indevido de recursos públicos. E o STF, que deveria ser o árbitro imparcial da Constituição, assume o papel de protagonista político, criando uma instância de conciliação que sequer encontra amparo jurídico. 

É hora de cada Poder voltar ao seu devido lugar. Só assim será possível restabelecer a confiança institucional e garantir que a democracia brasileira funcione com base nos princípios da legalidade, da responsabilidade e da separação dos Poderes — e não no ativismo, na omissão ou no privilégio.

*Arcênio Rodrigues da Silva é sócio do Rodrigues Silva Sociedade de Advogados.

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