Opinião
Fraude no INSS: quem protegerá os aposentados?
Ariane Maldonado é advogada especialista em Direito Previdenciário.
Ariane Maldonado é advogada especialista em Direito Previdenciário.

Recente investigação da Polícia Federal trouxe à tona um dos episódios mais vergonhosos da administração pública brasileira: um esquema criminoso de descontos indevidos sistemáticos nos benefícios de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). As apurações escancararam um escândalo de proporções nacionais, com vítimas em todos os estados, em sua maioria pessoas idosas, muitas vezes com pouca familiaridade com os meios digitais e com recursos limitados para reagir diante da injustiça.

Mais do que uma fraude financeira, estamos diante de um atentado contra a dignidade de quem passou a vida contribuindo com o sistema e, agora, em fase de descanso e merecido amparo, vê-se desprotegido. A vulnerabilidade exposta dos segurados evidencia o colapso de um sistema que deveria primar pela segurança e pela transparência. As falhas não são apenas técnicas, são morais e institucionais.

O caso revelou que entidades — muitas sem credibilidade ou autorização adequada — vinham lançando descontos nos contracheques dos beneficiários sem que houvesse consentimento expresso. Uma fraude travestida de associação, que drenava mensalmente valores preciosos da renda de quem vive, na maioria das vezes, com um salário mínimo.

O rombo financeiro causado aos aposentados é expressivo, mas o dano mais profundo é outro: a quebra de confiança em um sistema que deveria protegê-los. Quando um aposentado ou pensionista precisa se transformar em auditor de seus próprios contracheques para não ser lesado, é sinal de que o pacto de solidariedade social que sustenta a Previdência está fragilizado.

A recomendação oficial é para que os segurados consultem regularmente seus extratos no site ou aplicativo Meu INSS, embora válida, transfere indevidamente a responsabilidade ao cidadão. Ora, não deveria caber ao idoso desconfiar de seu próprio benefício mensal. Essa função é do Estado, que arrecada compulsoriamente, administra os recursos e deve, minimamente, zelar por sua aplicação justa.

A realidade é ainda mais desalentadora. Mesmo nos casos em que se comprova o desconto indevido, a devolução não ocorre automaticamente. A reparação exige iniciativa da vítima, que precisa ingressar com pedido administrativo, buscar apoio jurídico ou se organizar em ações coletivas. Em um país que se orgulha de ter um sistema previdenciário robusto, o mínimo que se espera é que a devolução dos valores ocorra de forma célere, com correção monetária e indenização por danos morais.

Vale destacar que os segurados têm direito à restituição integral, mas, para isso, precisam enfrentar uma estrutura lenta e muitas vezes insensível. É urgente que o governo institua mecanismos automáticos de ressarcimento, sem necessidade de judicialização. A reparação deve ser tão sistemática quanto foi o prejuízo.

Também é fundamental que os órgãos de controle avancem para além da repressão pontual. O sistema precisa de auditorias regulares, transparência ativa e ferramentas de denúncia acessíveis. Não se trata apenas de punir os responsáveis, mas de prevenir novas violações. É preciso proteger os aposentados de novas armadilhas financeiras, especialmente aquelas disfarçadas de legalidade.

Enquanto isso, recomenda-se que todos os segurados verifiquem seus extratos detalhados — disponíveis no aplicativo ou site do Meu INSS — e, caso encontrem descontos não autorizados, acionem imediatamente o INSS, entidades de defesa do consumidor ou o Judiciário. Também é possível, e recomendável, ativar o bloqueio de empréstimos e autorizações associativas, diretamente pela plataforma digital.

Por fim, é hora de um posicionamento firme da sociedade em defesa dos aposentados. O governo federal e o INSS têm que dar uma respostas urgente e imediata. O envelhecimento da população brasileira exige, mais do que nunca, um pacto de respeito e cuidado com os idosos. Permitir que fraudes como essa se perpetuem é não apenas uma falha administrativa — é um sintoma de descaso. E esse, o Brasil não pode mais tolerar.

*Ariane Maldonado é advogado especialista em Direito Previdenciário e sócia do escritório Lopes Maldonado Advogados.

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