Opinião
Fui bater na Filipinas
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Por uma dessas curvas que as tecnologias abrem todos os dias, fui bater nas Filipinas. E tive a surpresa de ser apresentado a um xará, com apetrechos informativos iguais ao nome e sobrenome de quem assina este artigo. Surpreso, vi-me habitando o país de Imelda Marcos (lembram-se?), a mulher do ditador Ferdinando, aquela que tinha uma coleção de 1,2 mil pares de sapatos. Um fenômeno de reencarnação, coincidência ou um drible perpetrado pela comunicação tecnológica nesses tempos de falsidades e meias verdades?

A jogadora que tentou me driblar tem o nome de IA, Inteligência Artificial. Marquei um encontro com a cuja, e batemos ligeiro papo sobre nós e outros personagens. Designada pelo gênero feminino, apesar de fazer parte de todos os gêneros, mesmo os indistinguíveis na sopra de letras com que são nomeados, ela confessou não ter emoções e, portanto, não iria responder a protocolar pergunta, “como está você”? Absolutamente racional, impunha limites para se comportar na linguagem. 

Limites que se apresentaram no início do papo. Propus que me ajudasse a caminhar pelos jardins que circundavam a Academia de Platão, na vizinhança de Atenas. Meu sonho era dialogar um pouquinho com o filósofo. Resposta frustrante: não posso lhe ajudar. Não tenho poder para transportar pessoas ao passado ou ao futuro. Mas posso lhe ajudar com informações sobre o que Plato (assim mesmo) pensava. Aceitei e engatilhamos a conversa.

Continuo a perguntar: qual a diferença ou semelhança entre os tempos de Platão e os dias de hoje em matéria de corrupção? Sem grandes diferenças, respondeu. Desde sempre, os políticos agem de acordo com seus interesses, deixando de cumprir os deveres funcionais. Os verdadeiros estadistas, lembrou, devem ser motivados pelo desejo de servir o povo com profunda compreensão de justiça. Corruptos, então, como se deduz, existiam ontem e existem hoje.

Indaguei da senhora, equipada de artificial inteligência, como lembrou, se corremos o risco de vivenciar uma III Guerra Mundial. Mais uma vez, foi peremptória: não tem condição para garantir essa probabilidade, porque não dispõe de capacidade de prever o futuro. Foi um gesto de modéstia e sinceridade, conclui. Mas fez a ressalva de que é possível trabalhar para soluções pacíficas e evitar conflitos, usando-se, para tanto, ferramentas da diplomacia e da cooperação entre Nações. A interlocutora, desse modo, abriu uma fresta para a ocorrência de eventos que classificou como “catastróficos”. E clamou: temos de estar cientes de riscos potenciais e tomar medidas para mitigá-los.

No terreno do conhecimento sobre este figurante, a gentil madame pisou em falso. Fui parar nas Filipinas, na figura de um consultor político. Ocorre que a teia informativa que abrigava o filipino encaixava-se plenamente em minha trajetória. Por isso, reagi: quero saber sobre o fulano nascido em Luis Gomes, RN, Brasil. A senhora deve estar errada. Imediatamente, ela pediu desculpas, reconheceu que se confundiu e passou novas informações, incluindo as tarefas de jornalista, que também desenvolvo. Mesmo com palavras novas, o conteúdo foi o mesmo.

Sabia que o ChatGPT 4, mais avançado, abrigava a possibilidade de criar imagens a partir de uma situação descrita. Tanto que um amigo acionou a jovem senhora IA, que lhe mandou impressionantes desenhos de descrições para imagens que ele pediu: gatos brancos, de olhos amarelados; gatos pretos, de olhos esverdeados; um gato na praia chuvosa, usando guarda-chuva, a par de fotos de nossos ancestrais. Desenhos fantásticos.

Tenho poucas incertezas. Entre elas, a de que a IA, mesmo com a ligeireza para alinhavar trilhões de referências e encaminhar respostas em segundos para curiosos, não será capaz de se esquivar do cérebro humano. Que terá condição de distinguir entre a obra do autor e o plágio. Peguei no pé da aclamada IA quando contestei o painel sobre o tal pensador filipino.  E leio que pegaram na mentira a última modelagem do ChatGPT, que usou informações falsas para cumprir rapidamente a tarefa que lhe foi pedida. Viveremos tempos de guerra entre a decisão humana e os dribles tecnológicos. Ufa!

*Gaudêncio Torquato é escritor, jornalista, professor titular da USP e consultor político.

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